Quero minha Placar de volta!*
Elias Aredes
Eu não queria acreditar.
Não aceitava.
A revista que foi uma referência do jornalismo esportivo morreu.
Com uma imagem.
Um tiro fatal em sua credibilidade e respeitabilidade construída por anos e anos.
Um “gênio” publicou um pôster em que utilizava uma foto para celebrar que o Corinthians era 99% campeão.
Não esperava outra atitude de Celso Unzelte que não o pedido de demissão do cargo de diretor de redação.
Digno.
Correto.
Sem espaço para a galhofa ou a brincadeira inconsequente.
A postura errática da Placar, agora de propriedade da editora Caras, não foi construída nos gabinetes do seu novo proprietário.
Nem na redação.
A imagem do pôster sem sentido é fruto nefasto de um jornalismo esportivo pobre, sem conteúdo e sentido praticado nos últimos 15 anos e em que nós, profissionais, somos cúmplices por omissão e cujo os protagonistas são proprietários dos meios de comunicação e boa parte de torcedores e jogadores.
Um jornalismo esportivo que despreza o legado de um combat ivo João Saldanha, que nunca, jamais, deixou de denunciar as mazelas do futebol nacional.
Que amava os craques, os estádios lotados, o torcedor pobre e sofrido e abominava os acordos de bastidores, os conchavos e as mutretas dos cartolas.
Não tinha brincadeira. Não tinha ninguém orientado a pegar mais leve ou só procurar o lado bom das coisas. Existia jornalismo. Puro e simples. Fez história.
No Século 21, em busca da audiência em volume, o jornalismo esportivo brasileiro entrou em um abismo infinito. Programas esportivos calcados mais na piada do que na informação e na denúncia das mazelas do esporte brasileiro. E tome brincadeiras, piadas e manipulação para deixar o torcedor sempre confortável e encarar o futebol como entretenimento.
Como esperar que Placar escapasse deste mundo de trevas? Díficil.
Estamos em 2015 e muitos acham mais saudável um comentarista soltar uma piada e uma brincadeira do que ele apurar uma reportagem ou um posicionamento voltado ao interesse público.
O que vale é o comentarista “pegar leve”, falar só de futebol ou divertir por divertir.
O futebol? Ah, esse que vá para o buraco. Só quero saber do meu time e mais nada.
De tanto insistir, os torcedores e profissionais adeptos do jornalismo esportivo “cor de rosa” conseguiram: mataram a Placar.
Assassinaram a revista responsável pela revelação do escândalo da Loteria Esportiva, trucidaram a publicação que abriu espaço para a Carta Aberta de João Saldanha após a sua saída da Seleção Brasileira ou que não teve pudor em explorar mais o lado culto e político de Sócrates do que suas peripécias no gramado.
Pior: jovens e adolescentes frequentam os bancos de faculdade crendo que este atual modelo tosco, distorcido e voltado ao entretenimento é o que vale investir.
São doutrinados a aliviarem nas críticas, a acumularem cultura esportiva para repetir escalações de modo mecânico e não para compreender como o futebol é um fenômeno social capaz de moldar um país e um povo.
Neste novo tempo, o tom de voz ou a postura corporal tem mais valor do que o caráter, os conceitos e o trabalho jornalistico do dia a dia. É a aparência e o conteúdo oco que triunfa sobre o profissionalismo.
Placar foi mais uma vítima.
Eu gosto de futebol.
Amo bola na rede.
Mas eu quero minha Placar de volta.
E o jornalismo esportivo de qualidade também.
NOTA DO BLOG: Um argentino, brilhante, Jesus Dátolo, impediu que o Corinthians fosse 100% campeão no domingo.
Na segunda-feira, outro argentino, opaco, Edgardo Martólio, impediu que a Placar fosse 0% acreditada.
*Texto reproduzido do Blog do Juca
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